segunda-feira, 16 de maio de 2011

E se?! Os Agentes do Destino, Sartre, e os limites do acaso


Acredito que, com frequência, todos pensam: "e se... ?", e seguem-se variações as mais diversas. E se eu tivesse ligado pra ela? E se eu tivesse escolhido outra profissão? E se eu tivesse chegado 5 minutos mais cedo? Mas, até que ponto escolhemos nosso caminho? Está tudo definido pelo destino, ou seguimos ao acaso?

No filme "Os Agentes do Destino", David Norris (Matt Damon) é um jovem candidato a senador dos EUA. Na noite em que perde as eleições, antes do discurso da derrota, conhece Elise (Emily Bunt) num lance do acaso. Influenciado pelo encontro fortuito, David fala de improviso, ignora o que estava escrito, e é ovacionado por todos. Tempo depois, mais uma vez ao acaso, encontra Elise. Mas, a partir daí, tudo muda. David é surpreendido pelos agentes do Destino, que atuam para pôr em prática o plano traçado pelo "Presidente". David fica sabendo que o tudo já está planejado, e cabe a estes agentes fazer com que a rota da vida não seja desviada. O "Presidente" até permite que tenhamos pequenos acasos cotidianos e um livre-arbítrio inofensivo, como escolher o almoço, por exemplo. Mas, no geral, vivemos todos num Show de Truman. Os agentes do Destino dizem a David para se afastar de Elise, porque isso atrapalharia o plano de vida dos dois. Contam que o primeiro encontro estava escrito, mas o segundo foi um descuido de um agente. E revelam que ambos teriam grande sucesso profissional se separados. Mas, caso se juntassem... David, claro, não aceita, e decide lutar a todo custo para fazer o próprio destino, tendo como motivação o amor.

No livro "Os Dados estão Lançados", Sartre aborda a mesma questão. Pierre e Eve nunca se viram em vida, mas se encontram no "além" após morrerem. Atraídos, lamentam não terem se conhecido quando vivos. Também nessa história, a vida é planejada e controlada por burocratas. Uma funcionária do destino descobre que houve um erro, pois Pierre e Eve deveriam se conhecer em vida. E, pela lei nº 140 do Destino, nos casos de amores não realizados, pode o Diretor autorizar a volta dos mortos para reparar o engano. Então, Pierre e Eve voltam, tendo que, em 24 horas, provar ser verdadeiro o amor. Pierre é um revolucionário que quer derrubar um governo. Eve é a esposa do Secretário de Milícia. Confrontados em vida com realidades tão distintas, surge o mesmo dilema do filme: seguir vidas paralelas rumo ao êxito individual já planejado, ou construir um caminho novo com base no amor?

No filme, David tem que escolher entre o amor e o sucesso político, naquele clima clichê americano. No livro, Pierre tem que escolher entre o amor e aquela besteirada de luta de classes, naquele clima clichê revolucionário-gagá (que bem poderia ter morrido junto com Stálin). Em ambos, o Homem se liberta do Destino, refaz sua história, e segue o caminho das suas convicções. Ele cria o seu propósito de vida, e a partir dele constrói a si mesmo.

Eu acho que, na vida real, não vai aparecer um buroocrata do destino revelando nosso plano de vida. Na verdade, nem mesmo acredito em destino. Prefiro a versão de vida do genial Richard Dawkins. Numa entrevista incrível, na FLIP 2009, disse ele, impactante:

"Indivíduos criam os próprios propósitos de vida. E crer que esta é a única chance que teremos nos faz valorizar mais a vida. É só calcular a probabilidade que tínhamos para nascer. Nossos pais precisaram se conhecer[...], o mesmo processo ocorreu com os nossos avós, bisavós, seguindo essa peregrinação até a origem da vida. Nós existimos por um fantástico acaso. Não desperdicem a vida. Não haverá outra!".

Portanto, cabe a nós ordenar o caos, tirar o que desejamos do acaso, e colocá-lo no cotidiano. Como disse Sartre em outro texto: "O homem está condenado a ser livre"...

  © Blog 'Croquis' Bahia Vitrine 2009

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