segunda-feira, 27 de agosto de 2012

À luz das sombras de Caravaggio


Está no Masp até 30 de setembro a exposição "Caravaggio e Seus Seguidores", que reúne obras do famoso e polêmico artista italiano e dos chamados “Caravaggescos”, pintores que deram continuidade à estética marcante de Michelangelo Merisi da Caravaggio.

Caravaggio ficou célebre por alcançar a excelência no uso da técnica chiaroscuro, e por obras com temas religiosos mas retratadas de uma maneira chocantemente humana. E ainda era uma espécie de rockstar da época, beberrão, imprevisível, metido com brigas de bar e insultos a governantes. Foi preso, expulso da cidade, acusado de homicídio, perdeu tudo... Enfim, a vida dele dava um outro longo texto. Fiquemos na obra, então.

Para mostrar a tensão entre o humano e o sagrado, Caravaggio utiliza o chiaroscuro, do italiano claro-escuro, para criar volumes. As telas possuem um denso fundo escuro de onde emanam as formas banhadas por uma luz intensa, dramática, que revela apenas o necessário. Esta técnica é magistralmente utilizada na tela "São Jerônimo Que Escreve", que retrata o trabalho de São Jerônimo em traduzir a Bíblia hebraica para o latim, criando uma versão mais acessível, conhecida como Vulgata, a Bíblia Definitiva. Essa tradução foi importantíssima para a expansão da Igreja Católica Romana, pois a partir dela surgiram as versões em línguas populares. Essa é a metáfora pintada por Caravaggio: um São Jerônimo que emerge das trevas e, iluminado, produz a Bíblia que deixa as obscuras línguas antigas para vir à luz pelo latim, o que, também, livrará do lado negro da força as almas daqueles que aceitarem a Palavra. Mas, contrastando com tarefa tão sagrada, está um homem que mostra sua fragilidade humana num corpo velho e frágil, cuja santidade é espreitada pela caveira da morte.

Em Caravaggio, luz e sombra são elementos opostos e complementares, uma dualidade que representa essa angústia de estar vivo. Afinal, se tudo fosse luz, não haveria contorno, e tudo ficaria sem definição, sem forma, monótono e sem sentido. Do mesmo jeito seria se tudo escuro. É na tensão entre estes elementos que se revela a vida como ela é.

Nossa existência se mostra, então, demasiada humana, nesse equilíbrio de extremos. O SCURO intenso, sufocante, que torna os caminhos incertos, e que nos angustia por parecer sem fim. Mas que cede, do nada, à beleza sincera da vida. Porque, de repente, CHIARO...

  © Blog 'Croquis' Bahia Vitrine 2009

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